[fragmentos entrelinhas] Sobre os pés de Frances Ha e subir um morro de bicicleta
uma crônica sobre amadurecimento.
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Antes de começar, aperte o play:
No último sábado eu subi a Ivo Silveira de bicicleta.
Depois de mais ou menos dois meses sem pedalar naquela frequência semanal, percebi que precisava dar uma volta — colocar o corpo em um movimento diferente. Escolhi o trajeto e nem lembrei que fazendo aquele caminho teria que subir a Ivo.
Para quem não conhece a região, explico: a Ivo Silveira é uma avenida que começa logo na saída da ponte Hercílio Luz, em Florianópolis, e segue reto toda vida por alguns quilômetros.
Acontece que, essa tal avenida, tem duas subidas que, bem… são um ótimo treino de pernas. Já fiz o trajeto algumas vezes e sempre me sinto desafiada de um jeitinho interessante. Não é só pelo esforço físico — nessa subida meus pensamentos sempre fazem boas viagens.
Quando cheguei no pé do morro, lembrei que teria que lidar com eles mais uma vez. Comecei imediatamente o ritual: reduzi a marcha até chegar na mais leve, acelerei para pegar embalo e respirei fundo. Os primeiros dois minutos de subida são primordiais: se não pegar embalo ali, o negócio fica duas vezes mais difícil — no mínimo.
Em uma dessas subidas eu me dei conta de que coloco muita intensidade no início e não consigo sustentar o mesmo ritmo da metade pro final. Com o tempo e a repetição, aprendi a administrar melhor minha força e os recursos respiratórios — sem pedalar em pé como tentei nas primeiras vezes.
Dessa vez, eu me dei conta de uma coisa bem importante: se eu não me esforçar para subir mais rápido e sim para manter a constância, sofro menos. A teimosia faz com que tenhamos pressa para subir, como se a velocidade fosse a escolha mais inteligente. Bobagem. Subi respirando e observando o caminho.
Mas esse trajeto não perdoa iniciantes. Quem pedala pouco, nunca pedalou ou tem pouco preparo físico não dá conta de subir — se der, é por puro capricho e as consequências virão no dia seguinte. Por isso, não há outra alternativa além de se preparar antes. Não gosto de cair nos clichês, mas aprendi escrevendo, que eles são um ótimo sinal de que as ideias estão saindo do quartinho subjetivo da nossa mente. Isto posto, fica um tanto óbvio o que direi a seguir: não há no mundo coisa que não possamos aprender, mas para fazer muitas delas precisamos nos preparar antes. É teimosia achar que não.
Foi com o meu corpo que subi a ladeira. O corpo que depois de muito pedalar, me deu fôlego para dar conta de aprender algumas coisas subindo um morro de bicicleta. Também foi com a soma de conflitos do agora que capturei nesse momento a lição do próximo capítulo: é difícil subir, mas não precisa de tanto sofrimento.
Dias antes assisti esse vídeo aqui e encontrei um pouco dos pés de Frances na minha subida de bicicleta. O vídeo fala da simbologia dos pés no filme Frances Há e de como a imagem dos pés descalços da Frances resumem toda a jornada de amadurecimento da personagem. Não vou entrar nos pormenores, porque o narrador explicou muito bem e o vídeo merece tua visita. Mas, caso você não tenha assistido Frances Há, esse é um filme sobre amadurecimento.
Na história, Frances vai de uma menina com uma melhor amiga em busca de algum reconhecimento na dança, para uma mulher que dá conta de si em todos os sentidos — apesar das dificuldades.
Um processo que leva dela tempo e observação. E, principalmente, coragem para encarar a vida de frente e não sofrer desnecessariamente no caminho.
Os pés descalços no asfalto. A subida sem forçar um sofrimento. As escolhas que decidimos bancar sem ouvir o que vem de fora. Todas essas coisas que carregam simbologias tão individuais e que exigem de nós tempo, observação e impacto. A colisão das nossas certezas com a realidade é o primeiro choque de anúncio da maturidade chegando. As coisas não são como nós queremos. Algumas pessoas aprendem isso muito cedo, seja pela falta de recursos, seja pela falta de afeto ou pelo simples excesso de promessas. Outras, levam uma vida e, bem… algumas nunca aprendem.
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