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“Aqui em casa pousou uma esperança. Não a clássica que tantas vezes verifica-se ser ilusória, embora mesmo assim nos sustenta sempre. Mas a outra, bem concreta e verde: o inseto.” Clarice Lispector
Esperar algum motivo para agarrar a esperança com unhas e dentes é uma brutalidade. A espera é sempre mais cautelosa do que deveria ser. Deveria. Às vezes escolho palavras que denunciam o que ainda aprisiona. Deveria é um verbo que habita o passado. E o que esperamos dele?
Já é de praxe soltar perguntas sem a pretensão de responder. Não quero as respostas. A espera — aquela mesma que chamei de bruta — me trouxe tantas que desacreditei da vida.
Desacreditei.
Desacreditar é sinônimo de desmerecer.
Desmerecer. Tornar-se indigno.
Ainda sinto vergonha de assumir. É feio dizer a si mesmo que você não merece a vida. O mundo não anda lá essas coisas, sabe como é, “são tempos difíceis para os sonhadores”, mas quando não foram?
Não existiu na história da humanidade uma trégua. Nem no paraíso retratado na bíblia houve paz.
A tentação mora nos detalhes, podemos aproveitar o sabor da fruta ou ouvir o falatório da cobra.
O que acontece na vida prática é que a esperança é assim mesmo meio lunática. Então, como treinar o olhar para manter a fé no que quer que seja, se sempre tem alguma coisa muito esquisita acontecendo?
Quando perguntei para a Mariana “o que te faz ter esperança?” não esperava uma resposta tão precisa.
— Não é o que, é quem — ela respondeu.
Engoli a resposta e vim digerir por aqui.
Quem é que te lembra de manter a fé em deus e a fé na vida?
Quem te fala para não esperar os sinais, mas buscá-los ativamente?
Quem te tira para dançar no meio da sala?
Quem te faz um café quente?
Quem te diz para ter paciência mas não se resignar?
Quem te diz com um sorriso: tenha esperança?
A vida é cheia de gracinhas e como um sinal desses que a gente nem tenta buscar muita explicação para não se contradizer no ceticismo, conheci o verbo esperançar do Paulo Freire justamente no momento mais descrente da minha — e da nossa — história.
"É preciso ter esperança, mas ter esperança do verbo esperançar; porque tem gente que tem esperança do verbo esperar. E esperança do verbo esperar não é esperança, é espera. Esperançar é se levantar, esperançar é ir atrás, esperançar é construir, esperançar é não desistir! Esperançar é levar adiante, esperançar é juntar-se com outros para fazer de outro modo...” Paulo Freire.
Foi assim que “aqui em casa pousou uma esperança” — e como num passe de mágicas, parei de esperar.
“parei de esperar’. adoraria apagar e reescrever, mas achei de bom tom manter.
Será possível parar a espera? Eu não sei. E já falei que ando ocupada demais com as perguntas para me atentar às respostas. Esse negócio de ficar em algum lugar até que chegue algo ou alguém é tão passivo quanto desejar o prêmio do BBB sem sequer fazer a inscrição. Golpe de sorte? Claro! Mas o que custa tentar? A espera nunca, jamais, em hipótese alguma, admite a tentativa.
Bom, aí é claro que quem espera desacredita. Não há o que fazer.
O que quer que seja esse negócio que chamamos de esperança, é preciso ter coragem de cultivá-la.
Sei que ela parece meio bobinha, meio imbecil e ingênua, mas porque diabos insistimos nessa postura bem-resolvida a ponto de não nos entregarmos às imbecilidades. Que brutalidade é essa?
O mundo é um moinho, eu sei. Em pouco tempo não serás mais o que és, mas percebe quanta beleza existe nessas entrelinhas? Nem sempre é fácil levar adiante e juntar-se com outros para fazer de outro modo, mas que saída temos se não essa? Esperança é coisa de maluco mesmo, a vida como a gente conhece capricha nos esforços de manter a esperança bem distante.
Eu que sou rebelde, resolvi acreditar.
PS: manda esse texto pra alguém que te lembra de manter a esperança?
#1 - Para cultivar a esperança, que tal fazer um exercício? Volta no começo desse texto, dá play nos secos&molhados e escreve tudo que alimenta a tua esperança. Revisite sempre que sentir tudo meio assim sei lá.
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Eu estava conversando sobre isso com o Marcos esta semana. Como ter esperança exige coragem e como isso é visto quase como uma fraqueza por certos grupos da sociedade. Como se ter esperança realmente fosse algo lunático, até porque é muito cômodo ser pessimista e simplesmente aceitar que as coisas são como são, e é isso.